Sair do armário no trabalho sendo LGBTI+: devo ou não?
Sair do armário no trabalho é um tema que, dependendo da bolha social que você vive, pode ser um assunto completamente normalizado já ou ainda um tabu enorme que não será nunca mencionado. Pesquisas mostram que sair do armário aumenta a satisfação no trabalho, a intenção de ficar e o apoio emocional dos colegas de trabalho, enquanto ficar “no armário” tem custos – tanto para o indivíduo quanto para a empresa.
Apesar dos direitos da população LGBTI+ estarem avançando em diversos países, – hoje já são 30 países onde o casamento entre pessoas do mesmo sexo é permitido – sair do armário no trabalho não é ainda fácil. Em uma pesquisa da consultoria Mais Diversidade feita com 2168 pessoas, apenas 15% dos profissionais LGBTI+ disseram falar explicitamente sobre o tema com sua liderança. Vamos usar essa pesquisa ao longo do artigo para nos referirmos a dados brasileiros.
Parte dessa dúvida geral vem porque não existe um manual de como fazer, não é exatamente um assunto muito comentado e, claro, muitas pessoas têm suas convicções.
Para isso, vamos explorar aqui neste artigo as questões que envolvem sair ou não do armário no trabalho e por que ela ainda não é exatamente uma escolha óbvia e fácil para muitos. A intenção não é convencê-lo, gay no armário, a sair, contar para todo mundo e comprar a brusinha de arco-íris da Renner. Não. É propor, sobretudo, uma conversa sobre o processo e seus prós e contras.
A sexualidade diferente do “normal” ainda é um tabu.
É importante olharmos a discussão para além da nossa bolha social. Você pode viver num ambiente relativamente aberto, mas isso ainda não se aplica a muitas pessoas. Quase 60% das pessoas LGBTI+ não falam sobre sua sexualidade com nenhuma pessoa do trabalho ou somente com as pessoas mais próximas, sendo que 20% disse que ninguém sabe.
Por exemplo, bissexuais, de modo geral, falam menos abertamente sobre sua orientação afetivo-sexual para todas as pessoas do seu trabalho, conforme aponta a pesquisa.
Portanto, é seguro dizer que a sexualidade ainda é um tabu para se comentar dentro do ambiente de trabalho para a maioria das pessoas. Quando perguntadas se sentem-se seguras para falar sobre sua sexualidade, apenas 30% disseram que sim.
Cada pessoa tem uma jornada de vida particular que impacta muito em suas decisões.
Um segundo ponto que devemos olhar com carinho é que cada pessoa passou por diversas experiências com sua sexualidade que vão moldando seus critérios na tomada de decisão. Enquanto existem pessoas que se descobrem e viver sua sexualidade desde muito cedo, tem muita gente que se “descobre” LGBTI+ aos 20, 25, 30 anos. Portanto, depois de muito tempo reprimindo sua sexualidade, muitas pessoas podem não achar que isso é relevante. Enquanto tem outras que, por terem vivido já, para elas é algo banal.
Soma-se a isso o fato de que raramente você só sair do armário uma vez. Você sai pro seu colega mais próximo, depois para mais pessoas, depois para a sua liderança, depois para uma outra pessoa, e por aí vai. Então, imagine isso para uma pessoa que não se sente confortável.
Isso leva muitas pessoas a viverem uma vida dupla quase: você tem sua “persona” do trabalho e uma personalidade fora. Tem gente que inclusive bloqueia redes sociais de colegas de trabalho para que eles não vejam alguma coisa específica. Eu achei uma pesquisa que descobriu que ter uma vida dupla – ser abertamente gay na vida privada, mas não no trabalho – aumenta o estresse social e a depressão.
Há várias maneiras pelas quais as pessoas LGBTI+ podem sinalizar suas identidades ou ocultá-las. Por exemplo, 47% dos entrevistados de uma pesquisa da HBR exibem objetos como fotografias, revistas ou símbolos para revelar sua identidade no trabalho. Em contraste, 21% das pessoas evitam revelar sua identidade mantendo-se calados quando colegas de trabalho falam sobre suas vidas românticas, e 23% disseram que evitam se comportar de maneira que possa estar de acordo com estereótipos associados ao seu grupo de identidade.
Nós, gays, aprendemos muito rapidamente sobre estereótipos e como usá-los para navegarmos no mundo social – e isso pode causar muita ansiedade. Gays que conseguem ser “lidos” como héteros descobrem rapidamente que não querem o estresse de sair do armário, uma vez que eles possuem privilégios por isso. Contudo, gays que têm traços mais estereotipicamente marcantes frequentemente sofrem mais ansiedade ao serem colocados numa posição mais vulnerável, como pro exemplo ao serem apresentados em público, um novo chefe ou mesmo nos primeiros dias de um emprego,quando são obrigados “a se conterem” para entender a dinâmica social da empresa que estão entrando.
Sair do armário no trabalho é muito mais que uma decisão de carreira.
Muitas pessoas com certeza estão mais preocupadas com a exclusão social do que com a penalização na carreira. Num estudo na Austrália, enquanto cerca de 19% dos entrevistados que não estão no trabalho se preocupam que suas carreiras seriam arruinadas se estivessem, 70% estão preocupados que sair do armário deixaria seus colegas desconfortáveis ao seu redor.
Assumir-se LGBTI+ é uma análise constante de custo-benefício e requer ponderar diferentes riscos. A falta de apoio de colegas de trabalho e supervisores, e experiências passadas de discriminação, muitas vezes impedem os trabalhadores LGB de se assumirem.
A importância de um ambiente social de apoio desempenha um papel enorme na decisão de sair do armário de uma pessoa. Então, o que as organizações podem fazer para desenvolver um espaço de trabalho em que viver autenticamente seja uma realidade cotidiana para os trabalhadores LGBTI+? Essa é uma pergunta que merece maior atenção e tem diversas empresas que trabalham como consultoria para diversidade e inclusão no espaço de trabalho.
Você deve sair do armário no trabalho?
Pesar se deve ou não assumir-se no trabalho depende de muitos fatores, incluindo onde você mora, se você está na família, em que tipo de indústria você trabalha e como você se identifica, se lésbica, gay, trans, bi, ou queer. O ponto de todo esse artigo é dizer que não existe uma resposta única. Enquanto para uma parcela da população, ser LGBTi+ é a coisa mais natural do mundo, como mostra a pesquisa, para a maioria ainda é um tema sensível.
Portanto, em discussões na web, já vimos debates entre pessoas achando completamente desnecessário e irrelevante sair do armário e outras falando que é um compromisso que temos para com as futuras gerações. Acontece que ambas as pessoas estão certas em suas visões. Não dá para vilanizar uma pessoa pelo fato de sua vida toda ter criado esse preconceito internalizado.
Enquanto algumas pessoas podem esperar um pouco mais para sair do armário no trabalho ou nunca fazê-lo, isso também é perfeitamente ok. Lembre-se, cabe a você se você quer sair do armário no trabalho ou não, faça em seus próprios termos e quando estiver pronto.
Se você puder sair do armário e não precisar mais se preocupar em esconder sua identidade, a recompensa provavelmente valerá a pena. Você pode até ficar agradavelmente surpreso com a reação dos colegas de trabalho ou da gerência, e pode ser a inspiração para outros colegas de trabalho LGBTI+ saírem do armário também.
Respeite seu tempo, o dos outros e todos viveremos melhor. Se puder, seja o suporte que você queria ter quando mais novo.